Lady Bharani – 15 de outubro de 2022
Damos prosseguimento a uma série de discussões sobre os sinalizadores do colapso no Ocidente. Tais indicadores fazem-se cada vez mais presentes em nossas sociedades, nas esferas financeira, comercial, política, social e cultural. Uma boa fonte de consulta sobre esse assunto é a obra The Five Stages of Collapse (2013)/Os Cinco Estágios do Colapso (2015), de Dmitry Orlov.
Aqui Quantum Bird responde às minhas perguntas dentro deste escopo, de forma pontual, concisa e muito generosa. Sua análise articula muito bem alguns desses sinalizadores do colapso, nos oferecendo um quadro mais abrangente – e demasiado preocupante – do nosso atual contexto civilizatório.
Lady Bharani pergunta a Quantum Bird
Pergunta: Agora uma pergunta sobre o Brasil. O resultado da eleição do novo Congresso brasileiro é, no mínimo, bem preocupante – esmerilhado em um forte viés conservador capitaneado por um discurso anti-institucional e antipatriota.
Mourão, Moro, Damares foram eleitos senadores. Pazuello, Sales, Dallagnol, Valdemar Costa Neto, Nikolas Ferreira, Cleitinho, Bruno Engler e Zema, só para citar alguns, também se elegeram.
Será que seria possível você conjecturar e traçar um panorama de impacto sob o povo brasileiro a curto e longo prazos a esse respeito?
Quantum Bird: Eu não usaria a palavra preocupante, diria mesmo desesperador. Seja pelo resultado, seja pelo diagnóstico da condição cognitiva e cultural que tal resultado nos permite fazer a respeito dos eleitores brasileiros. Acrescento às suas palavras um dado que considero relevante e que diz respeito à distribuição geográfica desses resultados. Isso precisa ser comentado. A maioria dos casos mais esdrúxulos aconteceu naquelas regiões que há muito reivindicam uma superioridade cultural no país e são populadas por pessoas predominantemente propensas a reivindicar cidadania europeia. Eu venho do nordeste, onde os resultados não foram ideais, mas casos desse tipo não aconteceram com esse nível de exuberância. De fato, observamos tudo isto de lá com muita desconfiança.
Vimos as reações das populações dessas regiões às iniciativas de melhoria sociais e econômicas, que beneficiaram os nordestinos, que eram os mais vulneráveis. Me vêm à mente médicos, e estudantes de medicina, brancos, alguns até bem loiros, indo aos aeroportos cuspir nos médicos cubanos [observe a imagem de capa desde post que retrata o fato]. Ou senhoras de classe média alta protestando contra a regularização do trabalho das diaristas, etc. Se relembrarmos de tudo isto, aí o resultado da eleição não chega a nos surpreender muito.
Se admitirmos que o comportamento passado é um bom critério para inferir o comportamento futuro, somos forçados a concluir que o impacto que a eleição deste senado terá no país, nos próximos anos, será devastador. As pessoas parecem ter votado com um ódio imenso do Brasil, com o objetivo explícito de sabotá-lo. Pessoalmente, acredito que não temos candidaturas a presidente nem perto do ideal. Sendo assim, era de se esperar que pelo menos as pessoas se preocupassem em eleger um congresso melhor, pois lá as opções eram mais generosas. Mas, infelizmente, vimos o oposto. Eu não esperaria nada de promissor ou razoável desse congresso. Vamos ver o que acontece no segundo turno para presidente. Por outro lado, cada povo tem a classe política dirigente que merece. Eu não partilho da tese de fraude indiscriminada, porque caminhando pelo país e conversando com as pessoas, o que transpira é exatamente o que vimos no resultado das urnas. Infelizmente.
Leitura recomendada:
Médica que vaiou cubanos chefiará Mais Médicos em 2019.
Ao invés de querer viver num país rico e pacífico, preferem ser medíocres mas podendo pisar em outras pessoas. Nada diferente do suicídio europeu nessa onda de russofobia. Sou branco hétero eurodescendente e vivam os nordestinos e os russos! Viva Luís Gonzaga e Piotr Tchaikovsky, só para nomear dois.
Muito obrigada pelo comentário, Paulo!
Sim, vivaaa!
Gostei da sua comparação com o suicídio europeu, porque é um dos caminhos para fazermos uma leitura de analogias entre o micro e o macro, um fenômeno global, macro de corrupção das esquerdas que começou na Guerra Fria, dissolveu a URSS, submeteu e humilhou a China, decretou o fim da história e foi se difundindo como as ondas criadas por pedras caindo em um lago. As esquerdas se tornaram fracas e a medida que fizeram concessões ao capital, cada vez mais especulativo, tornaram-se cada vez mais imprestáveis para a democracia, submissas à especulação, corrupção e ao entreguismo. Os lugares onde as maiores pedras caíram no lago, a Rússia e a China, se recuperaram do caos humilhante das invasões bárbaras dos piratas do ocidente fortalecendo, não as esquerdas propriamente, a oposição ao hegemon.
Do lado de cá, no micro, Brasil, já ouvi diagnósticos de gente que prefere votar, sabendo, em um presidente nazista com uma junta de generais traidores em guerra híbrida contra a nação brasileira que, em suma dizem, “a culpa por Bolsonaro é do Lula, que fez promessas de ir contra os neoliberais e colocou banqueiros credores do país para gerir sua economia, criou a remuneração de sobra de caixa dos banqueiros, deixou os sem terra acampados nas margens das rodovias uma década esperando redorma agrária, abandonou os índios, é um traidor, culpado dessa tragédia toda, prefiro arriscar do que votar nele”. Tal diagnóstico, é obvio, está errado, não se conserta o galinheiro com a tela furada escancarando a porta para as raposas, porém, para muitos parece perfeito, ainda mais se estão com a cabeça feita pelo gabinete comandado pelo setor de inteligência do Planalto. A culpa é das raposas, não do tratador das galinhas que obedeceu as raposas, não consertou e ainda aumentou o buraco na tela.
Se a esquerda está imprestável para a democracia, o que dizer da direita? Muito mais!
Qualquer raciocínio para diagnósticar o caos nacional falando em esquerda e direita, centro etc., já começa errado. Essa classificação não faz sentido, quem as usa está refém de uma rede de ilusões.