PT — GUERRA NUCLEAR — 8.5 A ameaça do terrorismo nuclear

MANLIO DINUCCI
 
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GUERRA NUCLEAR
O DIA ANTERIOR
De Hiroshima até hoje:
Quem e como nos conduzem à catástrofe
 
 
8.5  A ameaça do terrorismo nuclear

Em 2017, a Greenpeace apresenta um relatório sobre a segurança das centrais nucleares francesas e belgasredigido por um grupo de sete peritos internacionais depois de ano e meio de indagações. As conclusões são inquietantes. As 19 centrais nucleares francesas, que têm na totalidade, 58 reactores, estão mal protegidas perante um risco de ataque exterior.

O calcanhar de Aquiles destas centrais nucleares é constituído pelas «piscinas», os tanques de arrefecimento nos quais são armazenadas as barras de combustível nuclear que, depois de serem usadas nos reactores, ainda irradiam calor e são altamente radioactivas. Acontece que as barras são continuamente arrefecidas com água, durante alguns anos, para evitar que a sua radioactividade se liberte na área e se transmita ao ambiente. Cada uma das 58 piscinas dos reactores nucleares franceses contém centenas de toneladas de material radioactivo,uma quantidade duas ou três vezes superior àquela contida no núcleo do reactor.

Se uma piscina fosse danificada por um ataque do exterior, perdendo a água do sistema de arrefecimento, a radioactividade do material que se encontra no seu interior espalhar-se-ia na área, com consequências gravíssimas.

Um ataque do exterior é considerado possível, pelos sete peritos, porque, enquanto os edifícios dos reactores são dotados de protecções reforçadas, as piscinas são mal protegidas. Para demonstrar qual seria a sua vulnerabilidade, alguns activistas do Greenpeace penetraram, em 12 de Outubro de 2017, no interior do perímetro da central nuclear de Cattenom, na Mosella, lançando fogo de artifício, perto de um tanque de arrefecimento de combustível nuclear.

Para garantir uma segurança relativa às 58 piscinas dos reactores nucleares franceses – presumem os sete peritos – dever-se-ia gastar uma cifra compreendida entre 1,6 e 2,26 biliões de euros. Também, para cada uma das quatro piscinas da Central de La Hague, seria necessário entre 11,6 a 22,6 biliões de euros. Seria também necessário reforçar as protecções dos 58 reactores, gastando para cada um, entre 2,7 a 3,8 biliões de euros. A despesa total chegaria a 140-222 biliões de euros, o que é três a cinco vezes superior à despesa prevista para prolongar a vida das centrais nucleares francesas que, envelhecidas, apresentam mal funcionamento crescente e, assim, estão maioritariamente expostas aos acidentes. O estado precário destas centrais nucleares, a maior parte das quais já devia ter sido desmantelada, constitui um perigo não só para a França, mas também para os outros países europeus.

A possibilidade de um ataque terrorista a uma central nuclear em França ou noutro país, ou pior ainda, a um centro de tratamento de combustível nuclear tipo do que existe em La Hague e Sellafield, é real. Confirma-o o facto de que, em 2017, Greenpeace decide fornecer o relatório integral, apenas às autoridades francesas, em sete cópias e de divulgar uma versão «aligeirada» onde estão apagados todos os dados sensíveis, fornecidos pelos sete peritos, que poderia ser útil para a planificação de um ataque terrorista. No entanto, não é necessário ser um perito para compreender como poderia ser efectuado um ataque terrorista contra uma central nuclear. O mesmo seria, caso os camiões que transportam o MOX de La Hague, fossem explodidos ou se um navio carregado de combustível de plutónio fosse explodido no cais ou na água.

Existe uma situação análoga de risco de incêndio ou de ataque terrorista nos EUA, onde as ogivas nucleares, plutónio e urânio enriquecido são transportadas continuamente nas estradas por uma frota de 42 camiões articulados, gerida pelo «Ministério dos Transportes Seguros», uma agência no interior do Departamento de Energia, cuja actividade se esconde sob uma capa de secretismo. Os milhares de armas nucleares americanas, cada uma constituída por cerca de 6.000 componentes, necessitam de controlos periódicos e de intervenções de manutenção. Para realizar essas operações, são enviadas para a Pantex Plant, perto de Amarillo, no Texas, procedentes de diversas instalações militares: pelos silos de mísseis balísticos intercontinentais de Wyoming, Colorado, Montana, Nebraska e North Dakota; pelas bases de submarinos de ataque nos Estados de Washington e Georgia; pelas bases dos bombardeiros estratégicos na Louisiana, North Dakota e Missouri. Na Pantex Plant, as ogivas nucleares são desmontadas e os diversos componentes são transportados, sempre em camiões articulados, para outras fábricas: por exemplo, os componentes de urânio e plutónio vão para o Tennessee e para o Novo México; os cilindros de gás radioactivo vão para a Carolina do sul; as espoletas para o Missouri. Dessas instalações nucleares, os componentes são reenviados para o Texas, onde tornam a ser montados na Pantex Plant. No final, as ogivas nucleares são transportadas, sempre em camiões articulados, para as respectivas bases.

Os 42 camiões articulados, carregados com ogivas nucleares e componentes de plutónio, percorrem todos os anos nos Estados unidos – 5 milhões de quilómetros através de zonas desabitadas, autoestradas e metrópoles super povoadas. Cada camião acompanhado por dois ou três veículos, tendo a bordo uma dezena de agentes armados e os mesmos camiões estão dotados de um sistema de segurança, entre os quais se contam eixos das rodas que explodiriam se um grupo terroristas, eliminada a escolta, tentasse levar o camião articulado. No entanto, este também poderia ser atacado com armas anti-tanque de ogivas penetrantes. Há também dúvidas fundamentadas sobre a fiabilidade do pessoal dos comboios nucleares, na maior parte constituído por antigos comandos das forças especiais e veteranos das guerras do Iraque e do Afeganistão. Como revela um inquérito, efectuado em 2017 pelo Los Angeles Times, estes «correios nucleares», submetidos a turnos extenuantes e treinos esforçados, são afectados por distúrbios do sono e irritabilidade e, em geral, estão descontentes com o seu trabalho, que é mal pago. Um inquérito efectuado em 2010, pelo inspector geral do Departamento de Energia, apurou problemas alcoólicos espalhados entre os «correios nucleares», alguns dos quis são detidos por embriaguês. Os comboios nucleares do «Departamento dos transportes Seguros» são tudo menos seguros.

Efeitos análogos aos de um ataque a uma instalação ou a um comboio nuclear poderiam também ser provocados, ainda que a uma escala menor, por uma arma radiológica, habitualmente designada como «bomba suja»: um engenho explosivo comum embalado com material radioactivo, feito detonar numa zona densamente povoada. Uma arma radiológica é muito mais fácil de construir do que uma arma nuclear, que requer conhecimentos, tecnologia e material físsil (plutónio ou urânio altamente enriquecido) dificilmente disponível, também se não exclui que possa ser fabricado um engenho nuclear rudimentar. Pelo contrário, não é difícil procurar os materiais necessários para fabricar uma bomba suja: as substâncias radioactivas utilizáveis para tal fim (cobalto-60, césio-137, irídio-192, amerício-124 e outros) são empregues em diversos sectores civis, como na medicina, na indústria e na pesquisa científica, em quase cem países . Segundo os dados da Agência Internacional para a Energia Atómica, desde o fim dos anos 90, os furtos de materiais radioactivas aumentaram muito, em alguns casos também o urânio altamente enriquecido e o plutónio, que voltam a ser vendidos, clandestinamente, aos traficantes internacionais.

A possibilidade de realizar uma arma radiológica depende não só da disponibilidade dos materiais radioactivos, mas também dos conhecimentos tecnológicos de quem pretende usá-los. Existe, além do mais, uma vasta gama de possibilidades de usar os materiais radioactivos para ataques terroristas, desde os mais rudimentares aos mais sofisticados. Uma arma radiológica não é uma arma nuclear: esta última tem uma potência explosiva milhões de vezes maior e espalha radioactividade numa área muito mais vasta. O uso de uma arma radiológica para fins terroristas teria, no entanto, efeitos devastadores: ao explodir, provocaria o mesmo número de mortos e feridos de uma bomba convencional mas, nas horas seguintes, observar-se-ia também, que as pessoas que tivessem ficado ilesas na área circundante, seriam atingidas pelas radiações. As consequências seriam proporcionais à quantidade e ao tipo de substâncias radioactivas empregadas. A IAEA classifica os materiais radioactivos em cinco categorias: se bem que os da categoria 5 tenham um grau de perigo relativamente baixo, os da categoria 1 são de tal maneira perigosos que, basta uma exposição de poucos minutos para provocar um resultado fatal. Desta maneira, o efeito desejado estaria assegurado: a notícia da bomba radioactiva provocaria o terror e o caos. Além de fabricar uma bomba suja, as substâncias radioactivas poderiam ser usadas para envenenar o ar, a água potável e os alimentos. A primeira referência desse uso das substâncias radioactivas, encontra-se num memorandum redigido em 1943, pelo General Leslie Groves, Director do Projecto Manhattan, que permitirá aos EUA construir, em 1945, as bombas atómicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki. Ele especifíca: «A quantidade de material radioactivo necessário para provocar a morte de uma pessoa que o inala, é extremamente pequena. Foi estimado que um milionésimo de um grama que se acumulasse no corpo de uma pessoa seria fatal. Não são conhecidos métodos de tratamento para esse envenenamento. Não pode ser identificado pelos sentidos. Pode ser espalhado sob a forma de pó ou fumo, finamente pulverizado para penetrar o filtro de uma máscara antiga. Os materiais radioactivos podem ser usados contra grandes cidades, para causar o pânico e provocar vítimas entre a população civil. Os poços e as reservas hídricas poderiam ser contaminados e a alimentação envenenada com um efeito semelhante ao derivado pela inalação do pó. O material radioactivo produzido em quatro dias poderia contaminar 3,7 milhões de litros de água a tal nível, que um litro de água bebida num dia causaria, provavelmente, a incapacidade completa ou morte, no espaço de um mês».

Na primeira metade dos anos quarenta, enquanto estava em curso o Projecto Manhattan, o plano que prevê o uso de armas radiológicas é mantido afastado dos estratégas americanos, caso se demonstrasse impossível realizar armas de fissão nuclear. Por outras palavras, eles planificaram um ataque maciço com armas radiológicas, em particular, contra o Japão. A realização das armas nucleares fez superar esse plano. Posteriormente, as substâncias radioactivas foram usadas para homicídios seleccionados. São como exemplo, as provas científicas de que o líder Yasser Arafat tivesse sido assassinado pelos serviços secretos israelitas, contaminando a água ou os alimentos com uma substância radioactiva. Depois de ter jantado, em 12 de Outubro de 2004, no seu quartel general sediado em Ramallah, Arafat é atingido por uma doença misteriosa e devastadora, que o mata no espaço de um mês (o mesmo tempo previsto pelo General Leslie Groves para provocar a morte de uma pessoa, contaminando a água potável com uma substância radioactiva). Em 2013, uma equipa de cientistas suíços, depois de ter efectuado uma série de análises aos restos de Arafat, publica um relatório de 100 páginas  na qual demonstra ter encontrado níveis elevados da substância  radioactiva, plutónio-210.Não se pode excluir que o plutónio-210, ou outro material radioactivo, possa ser usado, com fins terroristas, para um envenenamento em massa.

Não podemos sequer excluir, entre os cenários possíveis, um «11 de Setembro nuclear»: um avião dirigido que, com um piloto a bordo ou teleguiado, atingisse uma central ou uma instalação nuclear tipo as de La Hague e Sellafield ou a Pantex Plant, com consequências bem mais graves do que o ataque às Torres Gémeas.O objectivo terrorista de tal alcance seria o de espalhar o pânico a uma escala sem precedentes, provocando um grande número de vítimas das radiações e tornando um vasto território inabitável. O seu objectivo poderia também ser o de criar um «efeito 11 de Setembro» ampliado,aproveitando a reacção da opinião pública internacional para desencadear uma «represália», também nuclear, contra o país acusado de ser responsável do ataque terrorista.

A seguir:  
 
8.6
As nano-armas: potenciais detonadoras da guerra nuclear

Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos

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